Bom, lá vamos nós de novo!

No último artigo, falamos um pouco sobre memória, de curto e longo prazo. Que a nossa noção de conhecimento, está intimamente ligada à capacidade que temos de nos lembrar dos dados, informações e contexto que já estivemos expostos em algum momento. Mas vimos também, se saber significa ser capaz de lembrar, o acesso às memórias em nosso sistema neuronal é a chave para definir nosso nível de conhecimento. Vimos que a memória é uma espécie de lugar onde a informação fica armazenada, mas que é a boa formação do caminho de acesso à ela que nos fazer lembrar.

Bom, isso traz algumas sugestões de como usar este sistema a nosso favor! Se ter o caminho bem marcado é a chave, então a repetição de acesso à memória, nos permite exercitar seu uso de deixa-lo “mais forte”. Como um tipo de “musculação neurológica”. A repetição e suas modalidades, que já falamos um pouco no primeiro artigo, são tipos de exercícios, mas hoje vamos refletir sobre um outro, bastante intrigante e ao qual estamos expostos o tempo todo, sem nos darmos conta, o PRIMING.

Priming ou Pré-ativação, é uma expressão usada para definir o efeito gerado pela influência que um estímulo pode acarretar na reposta a um estímulo subsequente, sem que exista consciência do indivíduo sobre tal influência (cf. Bargh, 2006; Bargh & Chartand, 2000).

Este efeito vem sendo estudado desde os anos 70 e largamente utilizados em área como propaganda, design, educação e muitas outras onde a comunicação tem um papel central. Um estudo contemporâneo, foi feito por Daniel Kahneman. Veja no video a seguir, uma fala do autor sobre o efeito do conceito de dinheiro, usando priming.

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Num experimento com alunos de ensino fundamental na Europa, que avaliou dificuldades em morfologia da gramática, ou seja, como escrever corretamente certas palavras, os alunos foram expostos a 3 tipos de ensino: sem priming, com priming oral e escrito e com priming oral e escrito e intervenção. O resultado, que pode ser conferido no estudo completo neste link, demonstra que usando priming e intervenção subsequente, os alunos passaram a escrever significativamente melhor.

Parece complicado, mas é mais comum do que você imagina!

Vou mostrar uns exemplos para ilustrar, ai mergulhamos em como este conceito pode nos ajudar com aprendizagem.

No caso dos alunos da Europa, este é um exemplo de perguntas que foram utilizadas

Conjunto de perguntas No.1

Repartir com os outros não é ser _________________________.

Que bom cheirinho; este café é mesmo ________________________.

Os pássaros saltam; estão a ______________________ no telhado.

Como você responderia às perguntas acima? Se apresentar estas perguntas para um grupo de 10 pessoas, será que as repostas serão as mesmas? Porque?

Vamos alterar um pouco o conteúdo das perguntas:

Conjunto de perguntas No.2

Ter inveja é o mesmo que ser _________________________.

Que bom aroma! Este café é mesmo ________________________.

Os pássaros cantam; estão a ______________________ no telhado.

Note que ao ler as perguntas do primeiro conjunto, a resposta é menos óbvia, que as do segundo conjunto. Mas o que tem de diferente entre elas?

Vamos usar a primeira pergunta para entender. A expressão “repartir com os outro não é ser” é uma definição do antônimo de invejoso, ou seja, para saber a resposta, você deve primeiro interpretar o conceito apresentado, mas mesmo assim, como se escreve a palavra invejoso? Lembra que o objetivo deste teste era avaliar a capacidade da morfologia na escrita dos alunos. Já a mesmo pergunta, no segundo conjunto, a palavra inveja dá uma dica da forma de escrita da palavra na resposta.

Na segunda pergunta do primeiro conjunto, mesmo falando de “cheirinho”, a resposta correta não é óbvia, já no segundo conjunto, da mesma forma que na primeira, a palavra “aroma” dá a pista da resposta, que é aromático.

E na terceira pergunta, fica mais evidente ainda a função do priming, onde a palavra “cantam” induz à reposta da palavra “cantar”.

Parece tudo meio óbvio que se apresentamos uma palavra como um dica a resposta fica mais fácil, então vamos ver um outro cenário para explorar melhor o conceito de priming.

Neste exemplo acima, a correlação entre pergunta e resposta, está na morfologia, ou forma de escrita das palavras, mas o priming também se aplica à semântica das mesmas. Assim, as palavras como Hospital e Médico, ou Restaurante e Sopa, se referem semanticamente ao mesmo contexto.

Veja a frase a seguir:

Ele consumiu toda a so_a neste dia!

como você preencheria a lacuna?

E se eu apresentar o seguinte contexto

O casal saiu para se encontrar num restaurante.

A palavra na frase poderia ser “sola” ou “sopa”, mas com o contexto do restaurante, fica claro que a resposta correta é “sopa”.

O que te faz lembrar da reposta certa é o fato de ter sido dado um contexto antes, em primeiro lugar, daí o nome priming para este efeito.

Na educação, como uma área onde a comunicação é uma ferramenta essencial, o priming tem muita funções. Veja a seguir, uma dica para professores, de como usar bem o efeito priming, no contato com os alunos. o conteúdo foi obtido no canal do Descomplica, neste link

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Uma das formas de aplicação do priming em educação, é com o uso de questionários, em especial os de múltipla escolha, quando tanto o enunciado quanto as alternativas na resposta, fornecem as chaves para que o efeito priming aconteça e o aluno possa exercitar o tal caminho de acesso à sua memória.

Por isso, os simulados em cursinhos pré vestibular são tão usados. Dou aqui um destaque especial para as aulas de revisão de suas questões resolvidas, onde o professor apresenta a questão, submete todos à oportunidade de responder novamente e discute o conteúdo da matéria referente à questão, gerando um aprendizado maior. É o efeito priming, que muda a percepção dos alunos sobre o conhecimento que já tem e fortalece o caminho e acesso às memórias sobre as aulas onde aquela matéria foi ensinada. Assim, a sessão de revisão de prova é às vezes mais eficaz em termos de aprendizagem, do que a aula original

Por isso, se você está se preparando para fazer uma prova de certificação, fazer simulados, com conteúdo preparado por profissionais qualificados, é uma boa prática, para fixar melhor o seu conteúdo. Note que me refiro à material profissionalmente construído para isso e não estes “brain dumps baratinhos” que existem na internet, onde entre 30% e 40% do conteúdo está incorreto, fazendo que você exercite seu cérebro da forma errada. Se der tudo certo, vai dar tudo errado! Seria como fazer um exercício para as pernas, com os braços, você vai acabar machucado!

Lembre-se que, se você já teve contato com um conhecimento, ele está ai, na sua memória, em algum lugar, sendo que tudo que você tem que fazer é fortalecer o caminho de acesso a ele e ganhar confiança no seu conhecimento.

Temos muita informação armazenada, que não sabemos que sabemos, só porque não nos lembramos. As técnicas de uso do priming, nos fazem resgatar esta lembrança, para pelo menos tomar consciência do conhecimento que existe na nossa “cachola”. Isso vai criar uma condição mais propícia para fixar a informação e tornar o conhecimento mais disponível.

Este processo aumenta seu nível de confiança sobre seu próprio conhecimento, assunto que já tratamos, neste artigo

Em breve, trarei aqui mais detalhes de um sistema que utiliza este conceito de priming, por meio de perguntas e repostas de múltipla escolha, aliado outros conceitos de neurociência e psicologia cognitiva, que pretende revolucionar a forma como aprendemos e acima de tudo, como demonstramos proficiência em conhecimento de forma geral.

E você, já conhecia o priming? Já estava usando e não sabia? Já usou em outras áreas? Acha que o priming pode ser útil? Me conta suas histórias nos comentários!